Arquivos Diários : setembro 8th, 2021

Transforma MP e coletivos enviam carta ao presidente da Câmara dos Deputados pedindo para apreciar um dos pedidos de impeachment contra Bolsonaro

O Coletivo Transforma MP juntamente com as entidades jurídicas Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), a Associação Advogadas e Advogados Públicas para a Democracia (APD), a Associação de Juízes para a Democracia (AJD), o Instituto de Pesquisa e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (IPEATRA) e o Coletivo Defensoras e Defensores Públicos pela Democracia enviaram uma carta ao presidente da Câmara dos Deputados do Brasil, Arthur Lira.

O propósito do documento é solicitar ao deputado que analise um dos 136 pedidos de impeachment acumulados ao longo do mandato do então presidente da República, Jair Bolsonaro. 

As entidades enfatizam que os discursos de Bolsonaro durante as manifestações pró-governo que ocorreram no dia 7 de Setembro em Brasília e em São Paulo  representam uma grave ameaça à democracia, à constituição federal e uma afronta aos demais poderes em exercício no Brasil. 

“Foram pronunciamentos criminosos e de imensa gravidade. Tecnicamente, podemos afirmar que estão, mais uma vez, reunidos todos os elementos jurídicos para a caracterização de crimes de responsabilidade pelo Senhor Jair Bolsonaro. Politicamente, verificamos que não há mais espaço para que essa Casa Legislativa finja não ver a escandalosa prática de crimes, que tem obrigação de analisar.”

CARTA ABERTA AO PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, ARTHUR LIRA

Senhor Deputado,

Nunca em nossa História a democracia foi tão clara e veementemente atacada de forma pública e reiterada por um chefe da nação. Nunca o perigo de uma ditadura com golpe contra a Constituição Federal foi tão claramente anunciado, com a prática de tantos crimes, comuns e de responsabilidade.

Vossa Excelência foi eleito pelo povo de seu Estado para o mandato parlamentar, e por seus pares para a honrosa missão de presidir essa Casa Legislativa. Seu compromisso primeiro é com a sociedade brasileira e com a Constituição que jurou defender.

Os discursos proferidos pelo Presidente da República, Jair Bolsonaro, na data de ontem, 07 de setembro na Esplanada dos Ministérios em Brasília e na Av. Paulista, em São Paulo, deixaram a sociedade brasileira completamente estarrecida.

A afirmação de que não vai mais cumprir decisões judiciais e a intimidação direta feita a um ministro do Supremo Tribunal Federal são afrontas à independência dos poderes da República. As ameaças de não respeitar o resultado eleitoral, por desconfiança infundada no sistema, agridem não apenas a Justiça Eleitoral, mas a própria Câmara dos Deputados, que já pautou e votou o tema do voto impresso.

Foram pronunciamentos criminosos e de imensa gravidade. Tecnicamente, podemos afirmar que estão, mais uma vez, reunidos todos os elementos jurídicos para a caracterização de crimes de responsabilidade pelo Senhor Jair Bolsonaro. Politicamente, verificamos que não há mais espaço para que essa Casa Legislativa finja não ver a escandalosa prática de crimes, que tem obrigação de analisar.

Desse modo, nós, entidades do mundo jurídico que assumimos compromisso em nossa criação com a defesa do Estado democrático de direito, pugnamos que Vossa Excelência aprecie um dos 136 pedidos de impeachment que estão sobre sua mesa contra o presidente da República Jair Bolsonaro.

A democracia não pode mais ser vilipendiada impunemente.

Impeachment já!

Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD

Associação Advogadas e Advogados Públicas para a Democracia – APD

Associação de Juízes para a Democracia – AJD

Coletivo por um Ministério Público Transformador – Transforma MP

Instituto de Pesquisa e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho – IPEATRA

Coletivo Defensoras e Defensores Públicos pela Democracia

Um dia depois

Por Maria Betânia Silva 

Boa parte dos brasileiros passou as últimas semanas esperando o dia 07 de setembro de 2021,  para saber o que aconteceria no país, nessa data comemorativa da nossa independência de Portugal.

Essa expectativa foi gerada porque o “despresidente” (minúsculo mesmo),  um homem ensandecido na perversão/ subversão da vida pública e privada, ameaçava ministros do Supremo Tribunal Federal, insatisfeito com as investigações em andamento nessa Corte contra sua pessoa e apoiadores do seu desgoverno,  também esbravejava a ideia de transformar o tal dia 07 de setembro, na realidade, uma data da falsa independência do Brasil, tornada, porém, verdadeira após um século de repetição, no dia ” D” da luta brasileira marcada por posições contra a democracia e, em consequência,  em favor dela.

O “despresidente” que não junta “lé” com “cré” e estupra tanto a  semântica quanto a sintaxe toda vez que abre a boca,  instaurou o paradoxo no país.

Só pra dar uma ideia, ele anunciou e cumpriu com o promessa de  indicar para o STF um nome  “terrivelmente evangélico” num Estado que é laico desde 1889; ao mesmo tempo, passou a acusar o STF de jogar fora das linhas da Constituição e, para coroar a sua existência indesejada, desfilou no dia 07 de setembro num carro com a faixa presidencial verde amarela para uma cerimônia de hasteamento da bandeira brasileira (de cores imperiais e coloniais) o que ressuscitou a lembrança de  que ele já bateu continência para a bandeira dos USA. Portanto, a bandeira que o encanta é aquela que exibe mais estrelas, tanto as que são pintadas no tecido quanto as que lhe servem de broche.

O “despresidente” invoca a liberdade de expressão para perfumar os excrementos verbais que pronuncia e se aproveita desse valioso pilar do regime democrático para boicotar e destruir a democracia;  junto com isso, por conseguinte, desdenha da construção de uma sociedade verdadeiramente independente, duradoura, estável e amadurecida na convivência com as diferenças e na solução dos conflitos que são comuns à vida coletiva.

O dia 07 de setembro chegou. Foi ontem.

E  aí, o que se viu?

Nada que tenha sido bom o suficiente para neutralizar o gosto ruim que já amargava a nossa vida nacional.

País afora, sobretudo em Brasília e em São Paulo, o que se teve foi, de um lado, um vai e vem de ignorância verde amarela, uma turba histérica mergulhada em contradições, gente quase suicida, motorizada ou não;  e de outro lado, gente resistente com a consciência de fazer jus a alguma independência, gente gritando com os ” excluídos” para incluí- los na realização das promessas da democracia liberal, sendo certo que alguns acalentam o sonho da democracia social e, alguns outros, o do socialismo transformador da democracia representativa e formal em uma democracia participativa e material.

O que se viu foi um país dentro de um balão de ensaio, fora da das condições normais de temperatura e pressão, caracterizando um ambiente democrático completamente desestabilizado.

Então, se me perguntarem se o ” despresidente”, candidato a Messias, que traz o apocalipse, saiu forte ou enfraquecido da agenda que ele definiu, aproveitando- se do cargo que ocupa: o de Chefe do Executivo Federal, eu respondo que isso já não interessa. Forte ou fraco o que interessa mesmo é o que nos queremos e o que faremos.

Até porque, convém lembrar, apocalipse só existe para quem acredita em Messias, mas para quem não se deixa levar por profecias,  a vida se faz no dia-a- dia pondo a mão na massa, junto com a “massa”, repartindo o pão que sai do forno diariamente.

Pra mim, o que interessa mesmo é tirá- lo do cargo, o qual, aliás, ele nunca poderia ter ocupado. Havia concorrentes que mal ou bem leram algumas linhas da Constituição. Havia um, inclusive, que dedilha as cordas de um violão com a mesma delicadeza com que lê as linhas da Constituição, construindo harmonias.

Portanto, o recado das urnas em 2018 está mais do que claro agora, não?

Não houve erro de cálculo em contar os votos dados a esse  “despresidente” através da urna eletrônica, que funcionou direitinho. O que houve foi um desprezo pelo futuro do país por gente motivada pelo egoísmo de pensar a vida a partir e em direção ao seu próprio umbigo. Uns apertaram o botão sem refletir, outros o fizeram com convicção e muitos, muitos mesmo acharam que nem valeria a pena apertar botão algum.

Viram agora a importância de um botão? Do botão nasce a rosa e mesmo que ela carregue alguns espinhos nunca pode se confundir com eles. Muitos brasileiros não cuidaram do botão da rosa em 2018, o deixaram secar e hoje ele nos faz sangrar;  o botão seco foi nos transformando num espinho cada vez mais parecido com ele.

Será que agora dá pra entender que a chegada dessa homem sem brilho nos olhos com espuma na boca autorizou o uso do força e não o uso da força do direito?

Será  que deu pra perceber que pra ele o direito é o uso da força? Não há linhas de Constituição pra ele porque linhas são limites e a força atua sempre que os limites são ultrapassados.

Ficou claro agora que com ele, os seus desígnios e os seus delírios, se projetam sobre todos nós e que assim perdemos um pouco da beleza, um pouco do perfume e estamos perdendo todas as pétalas que nos faria desabrochar?

Deu pra sentir que agora estamos todos tendo que extrair forças – não se sabe de onde – para enfrentar a devastação que ele vem provocando, na democracia, nas florestas, nas panelas, esvaziando- as e deixando a todos com fome de vida, de feijão, de futuro e de palavras afetuosas?

Deu pra sentir o tiro de fuzil no estômago embrulhado de ar?

Deu pra sentir que a política é uma dimensão da vida a ser levada a sério para definir os destinos de vida individual e coletiva?

O que fazer agora?

Já que perdemos todas as oportunidades anteriores de mudar o rumo da nossa vida que já não nos eram favoráveis desde 2014, quando a Lava Jato começou a destruir nosso jardim com o discurso messiânico antes mesmo do Messias que chegou em 2018, para completar a tarefa deixada a cargo de um traidor em 2016; já que não fomos em peso no dia 07 de setembro (ontem) para as ruas…já que… que tal se marcharmos no dia 09 de setembro – quando ocorrerá a marcha das mulheres indígenas – em  todos os cantos do país? Que tal, hein?

Sejamos protagonistas das nossas lutas e abandonemos a cadeira de espectadores da nossa desgraça.

Sejamos apoiadores dos povos indígenas que nos dão uma lição de independência na defesa dos seus territórios.

Inspiremo- nos na natureza dessa força ancestral, façamos da nossa voz uma flecha certeira.

Maria Betânia Silva – Procuradora de Justiça aposentada MPPE e membra do Coletivo Transforma MP